FAROESTE: TERRAS SEM LEI E SUAS CONSEQUÊNCIAS ECONÔMICAS

Os fatos revelados com a deflagração da Operação Faroeste em novembro de 2019, destinada a apurar a existência de esquemas ilícitos de forja de documentos e decisões judiciais para saquear produtores rurais no Oeste baiano, tem levado a perplexidade e temor. Produtores de porte já revisam planejamentos sobre investimentos na região.

A Bahia chegou ao final de 2020 com o VBP (Valor Bruto de Produção Agropecuária) de R$ 41,16 bilhões, um estrondoso aumento de 13,5% em relação ao ano anterior. Evidente que os resultados do ano de 2020 refletem os planejamentos e investimentos feitos em anos anteriores. Segundo a Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, o agronegócio representa 23,4% do produto interno do Estado: quase um quarto de todas as riquezas da Bahia são geradas pelo agro, que ainda leva emprego e crescimento a áreas sertanejas outrora esquecidas.

Adam Smith, nos seus “Ensaios Filosóficos” (1755), dizia que “para se transformar um Estado do mais baixo nível de barbárie ao mais alto grau de opulência são necessários paz, tributação leve e uma tolerável administração da justiça.”

O alerta sobre a insegurança jurídica não é novo. Em 2005, a Cúpula Íbero Americana de empresários, reunida em Salamanca (Espanha), alertava que “a tremenda insegurança jurídica é o grande problema a ser resolvido para gerar um clima propício à segurança e investimentos” na América Latina. Na mesma época, o então presidente da Confederação Nacional das Indústrias, Carlos Eduardo Moreira Ferreira, alertava para o fato de que, “a despeito das vantagens comparativas de nosso continente, o Mercosul não se consolida devido à insegurança jurídica, que espanta investidores”. O recado é claro e facilmente verificável: riquezas naturais, por si só, não trazem prosperidade.

O clima de insegurança jurídica no oeste baiano, se não contido com ações concretas, gerará efeitos econômicos deletérios: qualquer decisão de compra de terras na região afetada deverá levar em conta o risco real das matrículas serem posteriormente anuladas por conta de possíveis ilegalidades pretéritas. Qualquer investimento levará em conta o risco da insegurança jurídica. O resultado tende a ser a desvalorização das terras –  com títulos de propriedade vistos como suspeitos pelos players – sem contar os problemas de aceitação das mesmas como garantias em financiamentos agrícolas. O risco real de redução dos investimentos pode levar a um cenário de grandes terras de baixa produtividade, com impactos sistêmicos na renda, emprego e arrecadação.

É necessário que as instituições locais façam o “dever de casa” e transformem o terremoto da referida Operação num marco de  saneamento institucional. O Tribunal de Justiça da Bahia é o mais antigo do país e o Estado deu à comunidade jurídica brasileira nomes célebres como J.J Calmon de Passos e Ruy Barbosa.

É hora dos integrantes daquela Corte honrarem o nome da Casa, cortando na própria carne, separando o joio do trigo, melhorando os sistemas internos de compliance e correição e mostrando que o oeste baiano será um exemplo nacional de uma terra com lei. A pujança econômica virá a reboque.

Igor P. Wildmann

Doutor em Direito Econômico pela UFMG.
Advogado na área do agronegócio.
Autor de livros e publicações na área de Crédito Rural e Direito do Agronegócio.
Professor do Curso de Especialização em Direito Privado da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP.

(Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/04/2021, Coluna Opinião).